Matinho da Vila numa entrevista ao Jornal Tribuna do Norte.
Após tanto tempo sem subir num palco em Natal, o que a plateia verá neste show?Será uma apresentação baseada no novo trabalho, "4.5 Atual", que traz as minhas primeiras músicas do final dos anos 60, com novos arranjos e com uma qualidade melhor. Tem músicas que todo mundo gosta, como "Casa de bamba", "O pequeno burguês", "Quem é do mar não enjoa" e "Pra quê dinheiro", e outras menos conhecidas, como "Brasil mulato", "Amor pra que nasceu" e "Tom maior". Também tem as inéditas "Partido alto de roda" e "Samba dos passarinhos". Já é praticamente uma reunião de sucessos da minha carreira mas, se precisar, eu canto outras mais recentes que estão fora desse repertório.
Por que trabalhar uma obra de mais de 40 anos atrás? Você sentiu essa necessidade? Porque é um disco que todos gostam muito e foi gravado de forma quase caseira numa época de poucos recursos. A pouca qualidade do som incomoda até os ouvidos dos veteranos, e mais ainda da rapaziada mais nova. Quando a gente bota pra ouvir a diferença sonora é enorme. Portanto, em vez de só masterizar, quisemos refazer o disco de 1969, mas tendo o cuidado de manter a essência do original. A ideia foi regravar sem alterar muito, mas acrescentando instrumentos e fazendo harmonias mais transadas'. Por exemplo: em músicas em que só tinham violão e cavaquinho, acrescentamos um baixo e uma bateria, mas sem desfigurar a canção original. Não perde a essência, mas fica mais contemporâneo.
Você é um ícone do samba de raiz, e hoje há uma geração de fãs de vinte e poucos anos que valoriza bastante esse tipo de música. É mais informação ou uma onda de nostalgia? Eu acredito que seja mais informação. Há muitos fatores, como a conscientização sobre o estudo da música brasileira, que hoje já é abordado até em escolas. A cultura negra também passou a ser mais valorizada e estudada, acho que tudo isso contribuiu. Hoje tem gente fazendo mestrado sobre escolas de samba, samba-enredo, compositores clássicos... acho tudo isso incrível.
Você continua pesquisando ritmos de fora do samba? Está pensando em algo novo?No momento não estou planejando gravar nada de fora do samba, mas estou sempre ouvindo ritmos diferentes. Sempre gostei muito dos sons nordestinos, já usei sons de forró, de frevo... isso tudo é muito bonito.
Ainda acha importante abordar questões de raça no samba?Sim, mas deve ser feito de forma natural, sem aquela preocupação da militância exagerada.
Muita gente não conhece sua faceta de escritor. Está escrevendo alguma coisa atualmente?Volta e meio escrevo alguma coisa, já lancei onze livros. Mas no momento não estou escrevendo, gosto de fazer isso bem devagar, como diz aquela música minha...Quem faz as coisas com mais paciência, mais vagareza, muitas vezes consegue fazer mais. E quem quer fazer tudo ao mesmo tempo, às pressas, não consegue fazer nada. Não gosto de fazer nada pela metade. Quando surge uma ideia, começo a trabalhar nela aos poucos, por etapas.
Seus livros tem muito de biografia...Mas todo escritor na verdade é um pouco autobiográfico. Você sempre põe algo de suas experiências pessoais quando escreve algo, até mesmo quando fantasia personagens e situações. Também faço isso na hora de compôr uma música.
Aquela história de que "na minha casa todo mundo é bamba" parece também ser algo da sua vida real. Você tem uma série de filhas talentosas e que seguem o rumo da música. Como é essa relação com elas. Você incentiva o lado artístico delas?Não incentivo, não... não diretamente. Até parece que faço isso de forma planejada, mas não é. O fato é que nós estamos sempre juntos, somos muito apegados, e acho que isso com a música acontece naturalmente. A Mart'nália canta minhas músicas nos shows dela, e sempre pede minha opinião sobre o que ela faz. Também gosto do trabalho da Maíra (Freitas), que é uma pianista de formação erudita mas que sabe utilizar a cadência popular de uma forma muito original - o que é raro.
Você tem um bom relacionamento com os artistas mais novos do samba?Sim, mas tenho uma convivência mais próxima com Dudu Nobre, Diogo Nogueira, Ana Costa...tem um time bem forte por aí.