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18 outubro 2021

No RN, consumo de gás de cozinha é o menor em 9 anos, diz estudo

O consumo residencial de Gás Liquefeto de Petróleo (GLP) no Rio Grande do Norte, o botijão de gás, apresentou o menor consumo num intervalo de nove anos, segundo dados de um estudo feito pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE).

Em 2020, o consumo foi de 176 mil m³ do gás, queda de 9% em relação a 2019, quando o consumo foi de 194 mil m³. Os constantes aumentos no preço podem ser um fator para a redução nesse consumo, registrado em 20 dos 27 estados do país em 2020.

Aliado a isso, cada vez mais é possível observar famílias usando lenha para cozinhar. Em 2020, segundo dados do mesmo estudo, o consumo de restos de madeira em residências aumentou 1,8% frente a 2019, em todo o País.

Em Natal, por exemplo, o botijão de gás está com o maior preço médio do Nordeste na última semana, R$ 104,99, segundo último levantamento da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).

Essa realidade acaba se concentrando nas camadas mais pobres da sociedade. Em Natal, na ocupação Valdete Guerra, no bairro do Planalto, são várias as famílias que estão utilizando lenha para poderem fazer a comida diária.

“Uso a lenha porque o gás está muito caro. Muita gente não tem condições. O fogo a lenha demora a mais, acaba com as panelas. Tem que botar força nos braços e “arear”. E o problema também é que cozinhar a lenha tem dado dores de barriga na minha filha, porque a comida não fica bem feita”, explica o catador de resíduos sólidos, Matheus Silva de Lima, 24 anos, que mora na ocupação com a esposa e dois filhos.

O caso é parecido com Francisco Canindé Bezerra da Silva, 21 anos. Ele também mora na ocupação Valdete Guerra e não possui recursos suficientes para comprar um botijão de gás. Vivendo da reciclagem e de pequenos bicos, o natalense prefere usar os poucos recursos que tem para comprar a alimentação diária.

“Uso lenha desde o começo que cheguei aqui. Todo dia tenho que ir atrás da lenha. Estou na reciclagem, mas trabalho está difícil aparecer. É escolher entre comprar a comida ou o gás”, conta.

O presidente do Sindicato das Empresas Distribuidoras de Gás Liquefeito de Petróleo do RN (Sindigás/RN), Francisco Corrêa, explica que o preço do gás e mudanças na importação do produto no RN podem ser fatores que fizeram o consumo no RN ser o menor desde 2011. Há 10 anos, segundo ele, o GLP consumido no RN era 100% produzido no Estado. Atualmente, o índice é de 35%, sendo o restante do gás importado do Ceará e Pernambuco.

“Um dos maiores fatores do gás do RN ser um dos mais caros do Nordeste é que não temos mais produção. O frete encarece demais. Não temos um porto”, comenta. Ele explica que a redução no consumo de 2021 em relação a 2020 esperada pelo Sindigás é de 12% a 15%.

O presidente do Sindigás aponta ainda que a redução no uso do GLP pode estar atrelada a uma mudança em parte dos consumidores, que hoje estariam usando outros aparelhos, como micro-ondas e racionando o uso do gás. “É difícil fazer promoção no nosso segmento, mas estimulamos algumas, como cartão de fidelidade”, cita.

A coordenadora da ocupação Valdete Guerra, Sabrina dos Santos 31 anos, explica que para comprar seu botijão, precisou cortar vários gastos. “Deixei de pagar o curso de digitação da minha filha, de comprar os livros dela, nem material escolar. Tive que tirar para comprar o gás”, explica.
Ela comenta ainda que muitas famílias utilizam o botijão trazido das antigas residências. Na Valdete Guerra, são 200 famílias que moram num terreno da Prefeitura do Natal, onde deveria ter sido viabilizada uma lagoa de captação. As famílias cobram moradia digna e projetos para os moradores da ocupação.

Para o professor Thalles Augusto de Medeiros Penha, do Departamento de Economia na Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), a redução no consumo está diretamente associada aos preços do botijão nos últimos anos e à crise financeira da população. Aliado a isso, ele sugere benefícios sociais e mudanças fiscais para que as camadas populares consigam comprar o botijão novamente.

“Vejo que a tributação do gás é mais alta do que os combustíveis, só que a gasolina afeta classes com maior poder de pressão. Os impostos federais têm peso no gás. Então poderia se criar um mecanismo de restituição do valor pago. Então se paga R$ 100, R$ 30 é imposto, então via Nota Potiguar, cruzando com CadÚnico, dava para identificar pessoas mais vulneráveis e devolver esse recurso, como um cashback, por exemplo”, sugere.

Utilizar métodos alternativos para cozinhar a comida pode representar um risco à saúde do indivíduo, na avaliação do médico e chefe do Centro de Tratamento de Queimados do RN, Marco Almeida.

Segundo o médico, a falta de recursos da população para comprar o GLP tem feito muitos potiguares utilizarem álcool líquido e até mesmo o álcool combustível e etanol para acenderem o fogo. Ele aponta que isso tem ocasionado acidentes.

“Dispararam os acidentes, seja por cozinha e por esse uso do álcool. As pessoas colocam numa “cumbuca” e fazem um fogareiro. Em alguns casos, são queimaduras graves. Nós perdemos pacientes no início da pandemia”, explica. Não há dados atualizados sobre acidentes com lenha e álcool.

Uso do gás natural canalizado cresce no RN
Ao passo em que cai o uso residencial do GLP no Rio Grande do Norte, o uso de gás natural canalizado está apresentando crescimento no Estado. Segundo dados da Potigás, em 2011 eram 3.123 clientes residenciais. O número em 2021, até setembro, é de 32.335. Ao todo, a carteira da Companhia Potiguar de Gás (Potigás) possui 33.137 clientes, incluindo indústrias, comércios, postos de combustíveis, entre outros. Com uma rede de mais de 470 mil metros, a Potigás distribui o gás natural canalizado em Natal, Mossoró, Parnamirim, São Gonçalo do Amarante, Macaíba e Goianinha.
“Se observa no mundo inteiro uma tendencia para uso de combustíveis menos poluentes. Apesar do GNV ser fóssil, ele emite menos gás carbônico. O GNV comparado com o GLP é bem mais barato. Os prédios residenciais estão optando por questão de economia mesmo”, explica a diretora presidente da companhia, Larissa Dantas, acrescentando que 97% dos clientes da Potigás são de prédios residenciais.

Além do preço, o Gás Natural Canalizado tem sido utilizado cada vez pela fácil manutenção e o fato de que esse tipo de gás se dissipa rapidamente em caso de vazamentos.

Recentemente, segundo a diretora presidente, a Potigás assinou um contrato com a empresa Potiguar E&P, após chamada pública, para aquisição de gás natural. A partir de 1º de janeiro de 2022, quando se encerrará o contrato com a Petrobras, a Potigás vai adquirir o gás natural canalizado com redução de 35% no valor da molécula. Segundo a companhia, toda a economia gerada pela nova contratação será integralmente repassada para o consumidor final.

“O preço do gás natural e outros combustíveis está aumentando e a Petrobras fornece pra gente até o fim do ano, essa diferença pode ser ainda mais significativa. Podemos ter uma redução de até 40% no valor”, explica.

*Jair Sampaio

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