O Rio Grande do Norte não tem e nunca teve uma política cultural, infelizmente, e isso faz doer o coração de quem faz cultura nesse estado, que vive com o sentimento de abandono, de invisibilidade e mal visto pelos poderes públicos de todas as esferas. Muitos confundem editais com política cultural, o que é normal quando temos uma classe política culturalmente ignorante, e ignorância essa passada de geração em geração, onde, salvando uma ou outra exceção, ninguém tem tempo e muito menos interesse em se aprofundar nas questões da cultura potiguar. E do lado dos fazedores e fazedoras de cultura do estado a coisa não é muito diferente, há uma parcela que contribui muito para que isso continue assim. No cenário atual sobram publicações em redes sociais, de lado a lado, que fazem passar para o restante da sociedade uma realidade que está longe de condizer com o que vivemos no cotidiano.
Em nosso estado há muito sou uma voz perdida junto com outras poucas que cobram a efetivação do Fundo de Cultura do Estado. Cansado de participar de reunião com presidente e presidenta de fundação, com secretário, secretária, deputado, deputada, cobrar governador, governadora, e nada acontecer, de verdade. Eles e elas passam, passarão todo(a)s e a gente continua, sempre na mesma luta, falando das mesmas coisas (que coisa!?). Esse Fundo Estadual de Cultura foi criado em 2011, quando Rosalba era governadora mas nunca existiu na prática, da forma que a gente sonhava que ele iria acontecer, com acesso direto aos recursos. Se você acessar a página da Fundação José Augusto e clicar na aba que leva você para o Fundo, literalmente, você se deparará com a data de 02 de janeiro de 2014, às 10:51. Essa é a realidade da cultura potiguar: algo esquecido pelo tempo. É forte isso!
O que restou e que agora está muito fortalecido é o tal do Programa Câmara Cascudo, onde o governo do estado faz uma das maiores barbáries com o trabalhador e a trabalhadora de cultura e nem percebe, ou sim, que é colocar a decisão dos projetos aprovados com dinheiro público na mão da iniciativa privada, com as empresas ditando o que será apoiado ou não. Não combina com o governo que a Professora Fátima nos prometeu lá atrás. Há dois anos, em uma reunião da deputada estadual Isolda Dantas com o setor cultural falei isso, ela se manifestou favorável a discutir o Programa Câmara Cascudo, disse que tinha coragem para puxar essa discussão, direcionou uma equipe de advogados do seu gabinete, nos reunimos por várias semanas, convidei um amigo que participou de todo o processo de transformação de uma lei semelhante (de mecenato) para a criação do FUNCULTURA de Pernambuco, mas na hora de abrir a discussão para o estado veio a campanha eleitoral e com isso a conversa se perdeu.
Faço teatro desde 1998, vivo disso, e de lá para cá nunca houve um apoio certo do poder público de nosso estado para o setor cultural, lembrando que a cultura é um direito assegurado ao cidadão, como a saúde e a educação (nossa Constituição diz isso). Sempre aconteceram ações, algumas interessantes até, mas que nasceram para durar até o próximo gestor. Nada permanente. Permanente só a gente que fica sendo jogado de lá para cá, de reunião em reunião.
Dito isto, falo da pandemia onde me vi na situação de depender de um auxílio num governo bosta (não peço perdão pela palavra) como o de Bolsonaro e à medida que a vacinação avançou, nosso grupinho de teatro (acho que é assim que o poder público olha para a gente) passou a circular num carro Del Rey 1989, é o que temos, com uma difusora pendurada, pedindo alimentos, ajuda financeira e chamando o povo para assistir a um espetáculo numa praça qualquer. Tem gente que acha bonito. Eu acho é duro você não ter quem olhe por você nesse estado.
Veio a Lei Aldir Blanc de caráter emergencial, e no município de Mossoró, como em grande parte dos municípios do estado nos deparamos com muitas irregularidades, denunciamos, recebemos processo na justiça, nos desgastamos mas ganhamos o processo e assim a vida seguiu e felizmente ainda estamos vivos. No governo do estado, a Lei Aldir Blanc, tirando uma coisinha ou outra, considero que foi muito boa, feita de forma sensível, pela Fundação José Augusto. O apoio chegou a muita gente, principalmente por conta da divisão feita por regiões: região de Natal, região Assu/Mossoró, a de Apodi, a de Pau dos Ferros e por aí foi.
Passados esses anos nos encontramos no final de 2023 e por conta daquele desastre do governo federal passado, ainda estamos aqui a receber uma lei de caráter emergencial (agora chamada de Paulo Gustavo), que há quase dois anos se arrasta. Desta feita tudo se inverteu: a Prefeitura de Mossoró lançou editais da Lei Paulo Gustavo com uma atenção às pessoas menos favorecidas, diminuiu o valor dos prêmios para que mais trabalhadore(a)s tenham acesso, houve um cuidado para que a zona rural fosse atendida, e isso por conta do enfrentamento da Cooperativa de Cultura Potiguar, da qual faço parte, combinada a um secretário, Senhor Igor Ferradaes, que saiu do plano da conversa e se preocupou em colocar em prática os pedidos do setor cultural, principalmente da Cooperativa da qual faço parte, que se constitui num dos poucos instrumentos preocupados com a cultura de forma coletiva, além do próprio umbigo. Mesmo estando em uma gestão na qual não acredito (no prefeito Allyson Bezerra), o secretário de Mossoró merece esse reconhecimento, pela sensibilidade que teve em conduzir este processo. Já do lado do Governo do Estado, gerou muita expectativa, pelo valor dos recursos, pela quantidade de conversa (só com a Cooperativa da qual faço parte foram mais de quatro horas de reunião), pela demora na produção dos editais, pelas postagens nas redes sociais, pelo lançamento… mas a verdade é que os editais não foram cuidadosos, faltou sensibilidade, faltou experiência, faltou conhecimento do nosso estado, faltou respeitar os editais que já tinham no histórico da própria Fundação, levar em consideração o que os antigos companheiros fizeram, que inclusive eram da própria gestão do PT, então por que não aproveitar o que havia de legal por lá?
Se a Fundação José Augusto não corrigir os editais da Lei Paulo Gustavo, se não rever os inúmeros pontos falhos existentes, assistiremos a um seleto grupo aprovando projetos de valores maiores, com a maior parte de trabalhadore(a)s da cultura do estado ficando alheia. Uma circulação de 120 mil reais é um valor muito bom e necessário, mas quando temos limitação de recursos e grande quantidade de pessoas para serem atendidas por uma lei que é emergencial, o bom senso nos conduz, naturalmente a dividir. Melhor doze pessoas fazendo pequenas circulações de dez mil reais, ou até vinte pessoas com circulação de vinte mil, do que um apenas ganhar 120 mil, numa lei que é emergencial, falta essa visão.
Deixei por último para ninguém pensar que se resume a isso mas a Cooperativa de Cultura Potiguar tem mais de 40 cooperados, onde uma das vantagens de ser cooperado é poder usar o CNPJ da Cooperativa, que representa todos esses indivíduos, então o limite de projetos aprovados para uma cooperativa não pode se aplicar o mesmo limite de um CNPJ comum. A nossa cooperativa por exemplo pode aprovar 40 projetos diferentes que será cada um de um cooperado diferente. Não dar possibilidade para isso acontecer é ir de enfrentamento aos interesses do cooperativismo. Foi realizada reunião para isso, foi explicado, mas não foi observado. Por outro lado, a Prefeitura Municipal de Mossoró, da qual discordamos no campo ideológico abriu essa possibilidade em todos os seus editais, como é feito na FUNARTE, no Ministério da Cultura e onde houver bom senso.
O edital prevê que cinquenta por cento dos projetos é para a região de Natal e os outros cinquenta para o interior. Parece boa a ideia, mas como será isso na prática? Os editais anteriores do próprio governo de Fátima Bezerra já haviam pago essa matéria dividindo por regiões. Muito mais fácil a região de Apodi ter a garantia que não vai concorrer com a região de Mossoró ou de Caicó. É possível corrigir! Há tempo! Mas pela demorado da espera, a gente aguardava algo melhor.
Dionízio do Apodi.
Abraços e há braços!
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